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A Xícara Quebrada

Atualizado: 11 de abr. de 2022

Quando escuto Bolsonaro dizer que os indígenas já eram para estar extintos do território brasileiro, até relevo tais palavras, vindo daonde partiu tais conceitos.

Triste é ver que existem apoiadores, alguns faturando milhões na Amazônia, enquanto outros, tolos, que nem sabem o que estão dizendo. Um provérbio dos índios paiutes diz que "no início, Deus deu a todas as pessoas uma xícara de argila, e dessa xícara, eles beberam sua vida".

Beberam sua vida. Que simbolismo.

Será que os apoiadores do "mito" conseguem interpretar uma frase com essa magnitude? Sua semântica? Se souberem o que é semântica...

Aqueles que costumam dizer que os indígenas não querem trabalhar, que são preguiçosos, aqueles com suas ideologias que servem apenas para amenizar seus preconceitos sem noção.

E pode piorar, pois podem achar que estou me referindo aos processos civilizatórios de Norbert Elias. A xícara nesse caso, pode valer como metáfora, "figura", mas não custa lembrar as palavras da antropóloga norte-americana Ruth Benedict: "há aspectos da vida que nós achamos sumamente importantes e foram deixados de lado com pouca atenção por povos cuja cultura estava orientada em outra direção, mas não era pobre de modo algum".

Teorias que lembram o inesquecível Darcy Ribeiro. Teses que revelam culturas diferenciadas, mostrando que a ocidental não supera a oriental, a branca não é superior a amarela ou preta e vice-versa.

As xícaras vão depender de seus conceitos e valores, porém com afeto às raças e espaços históricos.

O provérbio indígena quer representatividade, respeito à sua história e suas normas. Ruth acrescenta dizendo que "restavam outras xícaras de vida que talvez contivessem a mesma água, mas a perda era irreparável ".

Ora, se quero dignidade às xícaras da minha velha vovó, que respeitem as xícaras dos paiutes, dos xavantes, dos guaranis, dos siox, dos nordestinos, dos paulistas, dos gaúchos...

Ninguém deseja ver suas xícaras quebradas por líderes insanos fascistas impondo suas ideologias a força. Ou na forca.

Apesar das diferenças, todo cuidado e consideração a todas as raças dando liberdade para qualquer sociedade conviver com suas xícaras, inclusive as destruídas.

Quando perguntaram ao escritor mineiro Campos de Carvalho se era feliz, ele respondeu um seco "não", e quando questionado, o que faria para mudar o mundo, outra resposta demolidora...nada.

Creio que nosso escritor percebeu que cada um se identifique com suas xícaras, quebradas ou não.

A desilusão revela um quadro social e humano, pois lembremos, a raça do homem, diríamos, é uma, única. Basta lembrar que nos quatro cantos do globo terrestre existem culturas como às tribos indígenas, os aborígenes, e tantas outras com suas peculiaridades.

E, enquanto as xícaras não quebram, que as réstias do sol fortaleçam almas penadas e depenadas.

Quantas vezes já disse que andar com fé eu vou porque com fé não costuma falhar, aliás, foi Gilberto Gil que consagrou a frase...

E quando acho que não resta mais nenhuma esperança, lembro da cena com o ator Richard Dreyfuss no remake do filme "O Destino do Poseidon"(2006), quando seu personagem suicida está prestes a pular do transatlântico e ao ver a enorme onda, repensa sua atitude. Sempre há esperança, mesmo quando o desastre está batendo em sua porta (navio).

Franz Kafka tem um relato chamado "Sonho do Encerrado", onde um preso ainda consegue se mexer num minúsculo cercado de madeira. Uma mensagem para os momentos de tempestades, quando estamos "cercados". Se bem que existe um "cercadinho" surreal em Brasília onde às xícaras estão quebradas e destruídas...em pedacinhos.

Mas lá, eles conseguem milhares de xícaras e não pretendo perder tempo para entender como eles bebem suas rotinas desonestas. Minha visão quer conhecer e reconhecer as águas abençoadas nas xícaras do bem, e que conservam, nem que sejam, pequenas gotas de líquidos puros. Mesmo as quebradas.

Não interessa, o relevante é que cada ser, cada raça, tenha e entenda que suas xícaras, quebradas ou não, são para beber suas vidas. Nossas vidas.

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