Não sei porque, mas na minha infância gostava de brincar de cavernas. Cavernas românticas construídas com lençóis e cadeiras.
Imaginava meus ancestrais (na época nem imaginava o significado dessa palavra), como homens primitivos, barbudos ao redor de suas fogueiras, cenários para Akira Kurosawa morrer de inveja. Já sei, você está esperando que eu fale da caverna do mito de Platão. Já chego lá. Por ora, quero escrever sobre outras cavernas. Caverna do Saramago, do Batman, do Capitão Caverna e de nossas cavernas existenciais.
Quem não lembra do Batman saindo de sua batcaverna a mil com seu batmóvel. O terror do coringa e do pinguim, esse escondido nas cavernas dos esgotos de Gothan City. O Capitão Caverna era um desenho animado da minha geração e que ainda é exibido em alguns canais até hoje.
Mas a idéia original desse texto surgiu diante de nossas "cavernas emocionais", quando não estamos passando por bons momentos. Quando estamos vivendo em celas ou cavernas, com nossa mente presa. Em época de auto-ajuda, vamos realçar essa força poderosa.
Edith Eva Eger, sobrevivente dos campos de concentração da Segunda Guerra mundial, traz relatos em seu livro "A Bailarina de Auschwitz", que narram episódios horríveis. Ela diz que "teria que encontrar a minha própria maneira de viver com o que aconteceu. Ainda não sei qual é. Estamos livres dos campos de concentração, mas ainda precisamos ficar livres para criar, para construir uma vida e para escolher. Até encontrarmos a liberdade". Existem situações onde nossa liberdade não corrobora com um mundo livre, nem física e muito menos espiritualmente.
A autora lembra, por exemplo, por que tantos prisioneiros já libertados pelos aliados acabavam retornando para suas celas nos próprios campos de concentração. O escritor José Saramago fala na sua obra "Caverna" que sociedades vivem encarceradas em seus mini apartamentos "duas daquelas janelas são nossas, só duas, perguntou Marta. Não nos podemos queixar, há apartamentos que só tem uma, disse Marçal, isto sem falar dos que as tem para o interior...do centro".
Platão relata um caso curioso em sua alegoria. Pessoas vivem como presidiários po toda sua vida dentro de uma caverna. Entendem seus universos somente através das sombras à sua frente proporcionadas por fogueiras. Visualizam apenas sombras e que são suas realidades, não enxergam mais nada, seus mundos não passam de sombras.
Acho que muitos vivem, em plena pós-modernidade, como se estivessem na caverna de Platão.
Resta cada um reavaliar se suas cavernas estão com caminhos abertos com luzes não muito distantes.
Fico me questionando onde estariam as cavernas românticas da minha infância...
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