Com esse título, até parece mentira.
Mas antes de falar em mentiras, não posso esquecer os céticos e como eles tratavam as verdades.
Eles não tinham um conceito definitivo para a verdade, pois o ceticismo amplia o leque trazendo dúvidas em quase todos os segmentos.
Gosto das teses deles, faz o leigo dúvidar até da morte. Exageros à parte, eles comprovam com inúmeros exemplos que a verdade pode ser dúbia. Quem possui a verdade? Quantas mentiras dizemos por dia?
Como digo, as violências culturais açoitam nossos cotidianos. O assunto é complexo. Ora, a verdade é a verdade e a mentira é mentira, simples assim, melhor ficar calado do que criar polêmicas tolas. Concordo, mas o ceticismo instiga a temática.
E suas oposições formam simetrias curiosas. Santo Agostinho dizia que existem aqueles que mentem e acreditam em suas próprias mentiras. E quanto aqueles que não sabem nem que estão mentindo? Confuso né, e complexo.
Além das questões subjetivas, tem mais, pois tem momentos em nossas vidas que acreditamos mais do que a realidade revela. E na era digital os fakes pulam por redes sociais pois o antigo papel amigo quase desapareceu.
Cada época divulga suas portas reias e imaginárias mesmo quando somos surpreendidos como quando Erasmo Carlos canta "Zico tá no Vasco, com Pelé, Minas roubou do Rio, a maré"...
Kierkegaard dizia que existem duas maneiras de ser enganado, uma é acreditar numa mentira e outra é deixar de acreditar na verdade.
Pois é, vejam só, crer numa fantasia não deixa de ser uma típica fraude honesta, não é mesmo?
No filme "A Culpa", do diretor Thomas Vintemberg, uma menina acusa seu professor de ficar nu em sua frente, deixando no ar suspeição de abuso infantil. A vida dele desaba, é condenado pela sociedade e perde o emprego, pois a "culpa" dele já está definida. Da mesma maneira quando as mídias malditas execram um vilão sem a comprovação da veracidade das acusações.
No filme de Vintemberg, a menina confessa que mentiu mas o estrago já está feito. Ainda assim, o personagem segue sua vida, reconquista amizades e emprego, porém o estigma de pedófilo fica colado em sua alma. As cenas finais são surpreendentes.
Quantas vezes cometemos o "pecado" de julgar alguém porque ouvimos que beltrano é isso ou aquilo? As vezes passamos anos com uma imagem de pessoas onde suas realidades são inversa aos nossos julgamentos, não é mesmo?
Reparem a relevância do ceticismo. É melhor não julgar ninguém, aliás, Alguém já disse isso...
Mentiras e verdades, oposições estranhas. Nas mídias malditas o paradoxo recrudesce dia a dia quando os interesses ultrapassam conceitos.
Descartes disse certa vez que para examinar a verdade, seria necessário colocar tudo em dúvida, nem que seja uma vez na vida.
Se mentimos por necessidade a fraude está na linguagem, mas aí surgem contradições do verdadeiro e do falso como atributos dessa tal linguagem que exerce sua essência, pois sem ela, não há verdades nem mentiras.
Isto significa que só existe mentiras ou verdades, ou fraudes, se a linguagem estiver presente. Óbvio, mas essencial.
Uma frase mentirosa, dolorida, trará suas eventuais consequências. A linguagem da menina destruiu o professor e o caráter dele foi para os canos subterrâneos.
E as mentiras bem vindas? As fraudes honestas? Se um ladrão invadir uma residência, lógico que mentiras são justificadas, assim como as parteiras egípcias que mentiram para que os recém-nascidos hebreus não fossem mortos, sendo aprovados e recompensados por Deus.
E não vamos esquecer da teoria "Espiral do Silêncio", (vejam texto nesse blog "Espirais Silenciosas"), onde pagamos um preço caro em nossa luta contra opressões culturais nos forçando a calar-se.
Em tempos de mentiras institucionalizadas, a verdade virou objeto de luxo. Excelente texto!