Todos sabem que temos apenas dois olhos, ninguém é louco para dizer o contrário. Talvez aqueles que já viram lobisomens, chupa-cabras, monstros com três olhos ou um ET com um olho só. Mas "vemos" mesmo apenas com dois olhos?
Tenho dúvidas, meu ceticismo não garante nenhuma certeza.
Quando tudo vai bem, o céu é amigo, as ondas são azuis e serenas, e até as tempestades que rasgam nossos céus são fraternas.
Porém, (lá vem ele, não dá para deixar assim, tudo bonitinho?), quando nossas emoções não estão dançando o baile das borboletas, vemos com outros olhos nossas finanças, cotidiano e crenças.
Nossos olhos enxergam de formas estranhas o que antes era doce, amável e sustentável. Normal, assim como o preso que busca réstias de sol nas grades desgraçadas que trancam seu corpo e alma.
E não precisa estar encarcerado entre paredes para sentir correntes no pescoço e na alma, os elos mentais são funestos como se fossem "vistos" a olho nu. Sabemos que almas encarceradas revoltam olhares normais...não é mesmo?
O mito da caverna de Platão comprova tais incoerências, e Dostoiévski quando estava preso recebeu a visita do Anjo da morte(Chestov).
Um anjo que desceu para separar corpos de almas, coberto de olhos, segundo Chestov, que dizia ainda que quando estamos em crise, vemos coisas estranhas e disformes.
Os céticos ampliam o debate, pois eles não garantem uma visão definitiva.
Quem já leu Dom Quixote sabe do que estou falando. Ver um dragão no lugar de um moinho de vento não é para qualquer um. Nosso herói maluco beleza com seu cavalo Rocinante tinha olhos especiais, acho que ninguém tem dúvidas. E quem garante que seu "mundo" extraordinário, além de não natural, não era mais engenhoso e digno?
Parece aquele rapaz que na segunda garrafa de vinho já está vendo duas corujas, ao invés de uma só, que está ali quietinha, calma, olhando não sei o que com seus enormes olhos...ah, são só dois...
Schopenhauer dizia que conseguia ver o sol apenas com um olho, se bem que olhar o rei sol é esquisito, sem uma visão conclusiva. Zaratustra já indignado de ver que o povo não entendia suas palavras e não escutavam suas frases, dizia que iria arrancar as orelhas do povo, para ver se assim conseguiriam ver e ouvir suas palavras pelos olhos.
Tem ainda aqueles jargões populares como "só vemos o que queremos". E quando estamos no escuro, nossa maior ambição é encontrar as tais frestas de sol. Mas e quando o sol estiver ausente? É muita desgraça, mas felizmente sabemos que o sol volta, ele sempre volta.
Para não ter a vergonha de ser feliz, quero curtir e ver as belezas terrenas e mesmo que Pascal diga que prazeres e jogos são fugas existenciais, não importa, vou seguir no jogo, porque depois temos os prazeres celestiais.
Pretendo ver as neves de Kilimanjaro de Ernest Hemingway quando for um moribundo, da mesma forma que seu personagem, mas ainda quero saborear por um bom tempo os presentes que "Ele" ofereceu por essas bandas ocidentais e orientais.
O filósofo Plotino dizia no século III, que somos sensíveis, quando partimos, inteligível, quando dirigimos e suprainteligível ao seguirmos em diante, mesmo não sabendo exatamente para onde.
Lembram de Ulisses que depois de passar por todas as agruras possíveis, e impossíveis, volta para Ítaca? Uma volta que durou 17 anos, e nem um canto fantástico como o das sereais foi suficiente para derrubar o objetivo de nosso herói. E ele finalmemte chega em Ítaca. Porém, tempos depois ele percebe que falta algo, que o local não é mais sua casa e segue seu destino, um caminho "suprainteligível".
Nem sempre vemos com clareza nossos objetivos e só vamos observar que não era bem o que esperávamos depois de "ver" bem seus resultados. E lá, vamos chegar a conclusão que não era aquele que queríamos. A léguas de nossos sonhos.
São caminhos, identidades e sentidos que fazem parte do mundo, sensível ou inteligível. Eles estão em nossos olfatos e visões, visões que nem sempre correspondem à realidade.
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