O conceito de inteligência pode parecer simples, mas também tem lá seus paradoxos. Para aqueles que acham que tem um nível acima da média, o perigo é deixar escapar novos conhecimentos pela sua arrogância. Pior são outros se iludirem por tirarem notas 8, 9 e 10 nas provas, onde a "decoreba" pode servir de elemento ilusório e se "acharem" pessoas inteligentes. Evidente que mentes como de Chico Buarque, Zé Ramalho e Bob Dylan, entre outros, estão em patamares elevados. Basta ler seus versos. Chico Buarque, para burlar e passar por cima dos militares, engatou um "apesar de você amanhã há de ser outro dia", Zé Ramalho desce da solidão num chão de giz e Bob Dylan alega que os moribundos estão batendo na porta do céu...
Enquanto isso, lembro das parábolas do rei Salomão e suas decisões justas na Bíblia Sagrada.
Talvez sua principal parábola seja aquela quando duas mães reinvidicam a maternidade da mesma criança. Salomão resolve cortar o menino em duas partes, sendo que uma mãe fica satisfeita enquanto a outra cede sua maternidade. Pronto. Para Salomão, a mãe é aquela que cedeu pois somente uma mãe verdadeira não desejaria "cortar seu filho ao meio". Histórias que elevam uma sabedoria anormal, elevada, justa e do bem. Adoro essas histórias do rei Salomão e suas "decisões" que comprovam sua sabedoria divina.
Já Zadig é um personagem do escritor iluminista Voltaire, aquele de "Cândido".
Zadig vive na Babilônia entre altos e baixos, uma vida com seus destinos e caminhos como qualquer outro (por isso a relevância da obra), mas sempre tirando da cartola soluções às diversidades.
Ele evolui e involui e com sua inteligência exacerbada vai superando todas as barreiras. É o merecimento de homens justos, virtuosos e honestos.
O penúltimo livro publicado por Voltaire (1747) antecipava as esperanças da Revolução Francesa e novas ordens mundiais. Zadig questiona, busca respostas e almeja um destino mais favorável. E Voltaire, reconhecendo o momento histórico, sabe que apesar da vida pregar peças, tenta resgatar o otimismo dos iluministas. Afinal o que é o destino?
Onde se decidem nossos caminhos em seus momentos existenciais (e históricos)?
Assim com o rei Salomão, Zadig apresenta caminhos onde a sabedoria é peça essencial, mesmo sabendo que seus conceitos e definições possam ter elementos complexos. Ou paradoxos.
Talvez por isso mesmo devemos estar alerta ao ensino e à clareza educacional para perseguir a sabedoria. E Zadig, assim como Salomão nos mostram caminhos.
Um dia uma viúva muito triste pela perda do marido disse que erigiu o túmulo junto há um riacho, e prometeu aos Deuses que ficaria junto ao túmulo enquanto as águas desse riacho correrem ao lado. Zadig disse que essa era uma mulher de honra mas descobriu depois que a viúva...desviou o riacho. Tempos depois, a viúva quis casar novamente mas seria necessário arrancar o nariz de seu esposo no caixão. Ela foi até lá e quando foi cortar o nariz do defunto, esse "milagrosamente" disse que isso era como desviar o riacho. Assim contou Zadig.
O livro conta outras de Zadig, pois sua vida, como já disse, seguia com altos e baixos, ele perde tudo, recupera, fica amigo de reis, é sabotado, recupera novamente, enfim...lições de vida, resiliência, sempre seguindo caminhos do bem e sabedoria.
Em suas andanças, numa fase onde Zadig estava "numa boa" como ministro na Babilônia, surge um novo problema. Os invejosos querem ver Zadig se ferrar e aguardam uma data especial. Havia na Babilônia uma discussão que já durava mais de mil e quinhentos anos e que dividia o império. A questão era que nunca descobriram como entrar no templo de Mitra, se primeiro com o pé esquerdo ou direito. Chegando tal dia, Voltaire escreve que "o universo estava com os olhos pregados em seus dois pés e toda cidade estava agitada e em suspenso". O que Zadig fez? entrou no templo saltando com os pés juntos e depois discursou dizendo que Deus não diferencia a perna direita da esquerda. A sabedoria resolvendo um problema de mais de mil e quinhentos anos...
Em outro momento, agora numa fase dificil, nosso Zadig está viajando e desejando morrer diante tantas maledicências, quando encontra um pescador também em péssimas condições, já se precipitando ao suicídio nas águas. Zadig socorre o pescador e ao saber que por coincidência, é um dos motivos da vida miserável do pescador, encontra solução para os dois sofridos. É, além de inteligência, temos que ter resiliência na vida e um pouco de...sorte...
Para saber a solução...Leia o livro...
Belo! Gosto muito quando seus textos provocam reflexões importantes sobre a existência humana. Parabéns!